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domingo, 13 de março de 2011

Contra o globalitarismo: Pobres seriam o agente político da nova globalização proposta por Milton Santos - Parte 4

No livro Por uma outra globalização - do pensamento único à consciência universal, Milton Santos observa a globalização sob três óticas: como fábula, perversidade e possibilidade para o futuro. A fábula é propagada por Estados e empresas, que colocam a globalização como fato inevitável. A imposição desse "pensamento único" naturaliza o caráter perverso do fenômeno e constitui o que Milton chamava "violência da informação". A perversidade da globalização se revela na medida em que seus benefícios não atingem sequer um quarto da população mundial, ao custo da pauperização de continentes inteiros. Vista como possibilidade para o futuro, ela passaria a empregar as técnicas de forma mais solidária, de modo a derrubar o globalitarismo -- termo cunhado por Milton que agrega ao conceito de globalização a noção de totalitarismo. Milton acreditava que os pobres seriam o agente político dessa nova globalização, sobretudo nas cidades onde há pessoas de todos os tipos e intenso debate. Os pobres passam pela experiência da escassez, conceito resgatado do escritor francês Jean-Paul Sartre: o mundo dos objetos se amplia e o pobre descobre que jamais vai possuí-los. A classe média se acomoda com o conforto do consumo -- que substitui a cidadania e amortece a opinião pública --, mas já experimenta a escassez. Como possui maior instrução, pode vir a deflagrar o movimento social que transformaria a globalização.



Santos era crítico contundente da noção de aldeia global: preferia dizer que o mercado nacional é o nome de fantasia do mercado global. O geógrafo também rejeita a noção de desterritorialização. Para ele, a globalização tornou o território ainda mais importante porque a concentração da
tecnologia de informação e comunicação diferencia os espaços em função de sua capacidade produtiva.

As maiores empresas atingem somente os pontos competitivos do território e trazem desordem para o resto, formando o que Milton chamava zonas opacas e zonas luminosas. As empresas exigem do Estado o aparelhamento das áreas privilegiadas para que se adeqüem aos imperativos
técnicos, mas uma adaptação das leis também se faz necessária. Assim, as empresas acabam por ditar a política nacional. O país se torna "ingovernável" porque nem o Estado nem as empresas assumem o controle total. O território acaba esquizofrênico, porque nele existem vetores da globalização, que impõem uma nova ordem, e vetores da contra-ordem, baseada na exclusão social.

A globalização paradoxalmente incita à violência, por exigir competitividade sem ética, e também incentiva a solidariedade mundial a partir da facilidade de comunicação. Cabe aos intelectuais
propagar a realidade contraditória do território e oferecê-la à reflexão da sociedade.

Na luta por uma outra globalização, Milton Santos correu o mundo participando de debates. Esteve presente no Fórum Social Mundial de Porto Alegre em 2001 -- encontro que se contrapôs ao fórum econômico de Davos, na Suíça.

A função do intelectual é "ser humilde frente à realidade, mas corajoso para criticá-la". No entanto, o ensino universitário que privilegia a técnica em detrimento do humanismo leva à proliferação daqueles que Santos chamava de "deficientes cívicos". Com isso, a intelectualidade se limita a atender o mercado, o que gera o pensamento único e intelectuais subservientes. Para Milton somente o ensino público poderia restaurar o pensar livre, mas o acesso restrito torna a universidade pública e gratuita um agente de exclusão social. O professor considerava a capitulação da intelectualidade um fenômeno internacional antigo, agravado recentemente sobretudo no Brasil, porque o grupo precisa se reunir muito mais para pressionar pela sobrevivência do que para pesquisar.

Raquel Aguiar
Ciência Hoje/RJ
dezembro/2001

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