*Bruno Elias
A realização do Encontro Nacional dos Estudantes do PT e o início das eleições de delegadas/os ao Congresso da UNE estimularam um debate importante no partido. Trata-se, afinal, de debatermos sobre o papel político a ser jogado pela juventude do PT na construção de uma UNE e um movimento estudantil democrático, de lutas e que estejam à altura dos desafios colocados para a esquerda no próximo período.
Colaborando com este debate, os companheiros Rafael Chagas, da executiva da UNE e Joaquim Soriano, da executiva nacional do PT, apresentaram em recente artigo a opinião de que frente a tais desafios, a juventude do PT deveria, no próximo Congresso da UNE, construir com as juventudes do PCdoB (UJS) e do PSB o que eles chamam de “unidade da esquerda na UNE”.
Consideramos esta opinião parcialmente correta. Ela acerta quando aponta a necessidade de unidade, mas erra quando propõe um tipo de unidade que bloqueia as mudanças necessárias para que a UNE esteja a altura dos desafios contemporâneos. Na nossa opinião, a unidade que mais contribui é a unidade do PT e dos demais setores que pautam a democratização da UNE, impulsionando uma alternativa política para a UNE e para o movimento estudantil.
2010 e os próximos anos
O próximo congresso e gestão da UNE se situarão num ambiente de crise mundial, cujo desfecho dependerá da mobilização massiva dos trabalhadores e da juventude.
As classes dominantes, em resposta a atual crise, querem socializar os prejuízos. Na educação, isto se traduz na pressão por cortes dos investimentos públicos em educação, bem como nas propostas de socorro aos tubarões de ensino, nas demissões, atrasos salariais e aumento de mensalidades nas escolas privadas.
Contra a política das classes dominantes, é certo que há inúmeros pontos de contato e unidade com as posições de outras juventudes partidárias. Inclusive no tocante as eleições de 2010.
No caso da UNE, no entanto, esse exercício deve ir além da retórica ou dos projetos comuns de resolução nos fóruns da entidade, já que na vida real a direção majoritária da UNE tem optado pela política do “vale mais um mau acordo do que uma boa briga” com os tubarões de ensino, reitorias e, inclusive, contra medidas governamentais conservadoras.
O PCdoB e seus aliados na UNE tentam muitas vezes reduzir as discussões sobre o papel do movimento estudantil na atual conjuntura, a uma polarização entre os favoráveis e os contrários ao governo Lula. Para justificar uma política de alianças, que não raro inclui a direita, superestimam as posições da ultra-esquerda – amplamente minoritária na base do movimento.
Tal polarização, além de artificial, acaba resultando no seu contrário, pois dá palanque ao esquerdismo, tornando mais difícil a posição daqueles que apóiam o governo, mas não aceitam uma UNE chapa branca.
A situação do movimento estudantil e da UNE
O que também exige uma discussão fundamental, porém escapa à avaliação do texto dos companheiros da Democracia Socialista, é a situação atual do movimento estudantil.
Partimos de uma avaliação menos ufanista da atual situação da UNE e do movimento estudantil brasileiro.
Para além dos impactos do conservadorismo ideológico e do refluxo do movimento de massas, acreditamos que a UNE e o ME vivem um momento de profunda dispersão, tencionada por uma crise presente de legitimidade e representatividade perante sua base social.
Além disso, a UNE e o conjunto do movimento estudantil não tem conseguido acompanhar as profundas mudanças ocorridas no perfil da juventude, dos estudantes e da educação superior. O ME, embora seja ainda o movimento juvenil mais organizado do país, está longe de ser a única expressão organizada da diversidade da juventude brasileira.
Compreender essas mudanças é fundamental para darmos lastro a uma pauta e agenda política que se identifiquem com a realidade dos estudantes. Se a sociedade mudou, a universidade mudou e os estudantes mudaram, porque o movimento estudantil deveria se organizar da mesma maneira? Recolocar o ME e a UNE a frente de grandes lutas no país exigirá um diagnóstico sério sobre essas e outras questões.
Todas as forças que dirigem a UNE são responsáveis pela sua incapacidade em enfrentar estes problemas. Mas, convenhamos, a responsabilidade do PCdoB e da União da Juventude Socialista e aliados é proporcional ao peso que eles possuem na direção da entidade.
Não estamos entre aqueles que consideram que a UJS é o “mal” do movimento estudantil. Contudo, ao ser fiadora de uma cultura política e de organização que imprime à ação das entidades uma orientação defensiva, institucionalizada e distante de sua base social, essa organização não ajuda a retomarmos o protagonismo da UNE e do movimento estudantil.
A tímida referência de Chagas e Soriano aos “avanços” da entidade indica tão somente o que todos já sabem: no essencial nada mudou. Ou seja, a relação da UNE com o conjunto do ME enfrenta limites cada vez maiores, sua linha política continua conciliatória e o controle da entidade permanece centralizado.
Construir uma nova direção para o movimento estudantil é, por óbvio, muito mais do que derrotar uma direção majoritária. Mas achamos impossível construir uma “nova” hegemonia, a partir de uma composição com a “atual” força hegemônica. O máximo que se pode conseguir, através deste caminho, é participar da maioria, não mudar a sua direção.
Nossa defesa da UNE é combinada com a defesa de mudanças profundas na condução e organização da entidade. No caso dos jovens petistas, essa defesa deve contribuir para elevar o nível de consciência dos estudantes, combatendo os autonomismos, a falta de referência partidária, o movimentismo e combatendo igualmente as práticas aparelhistas. Com a diferença que nós nunca patrocinamos, nem patrocinaremos, a divisão das entidades de massa, a exemplo da saída da CUT impulsionada pelo PCdoB.
O momento da juventude do PT
O I Congresso da Juventude do PT foi um espaço privilegiado de debate e reflexão sobre a intervenção dos jovens petistas nos movimentos sociais, dentre os quais o movimento estudantil universitário. Nosso Congresso reconheceu de maneira acertada em suas resoluções que se “levarmos o problema de organização da juventude para nossa intervenção nos movimentos juvenis, a situação é aquém da capacidade de mobilização real do PT. Hoje, não conseguimos ocupar em nenhuma das frentes de luta dos movimentos juvenis uma posição de centralidade. Atuamos de maneira fragmentada e, em geral, levando as disputas internas para o seio dos movimentos.”
No movimento estudantil, essa fragilidade é muito presente. A atuação dos petistas enquanto “frente de tendências” – e por vezes, de interesses - nos coloca em posição subalterna à política de outras organizações juvenis e fragiliza a presença dos petistas, subrepresentados nas direções das entidades gerais.
Superar essas debilidades e construir uma identidade do petismo nos movimentos juvenis não se confunde com ingerência na autonomia dos movimentos, que historicamente defendemos. O papel que cabe ao partido e é reiterado pelos fóruns da JPT, respeita e valoriza a autonomia do movimento estudantil, submetendo suas propostas à deliberação democrática das organizações estudantis.
Por esses motivos colaboramos ativamente com a construção vitoriosa do último Encontro Nacional dos Estudantes do PT que, mobilizando 24 estados entre plenárias e encontros regionais, apontou uma plataforma e um plano de ações comuns para a juventude do PT no movimento estudantil.
Neste ENEPT pudemos perceber que há espaço para outra política no movimento estudantil e que os jovens petistas estão dispostos a dar sua contribuição. Curiosamente, companheiros que tanto resistiram em debater com a base e com os estudantes do PT nestes espaços a atuação dos petistas no Congresso da UNE, hoje são defensores dedicados de determinada tática e política de alianças para o conjunto da juventude partidária.
Por fim, saudamos a iniciativa do debate. Reitera, mesmo com as diferentes posições internas em nosso partido, a importância da UNE na luta política e para os petistas. Com o mesmo afinco que queremos uma juventude petista enraizada na classe trabalhadora, organizada para além do ME, devemos reconhecer que na organização da luta dos estudantes o PT dá grande contribuição a este que é um dos principais movimentos juvenis do país.
Bruno Elias, 1º vice presidente da União Nacional dos Estudantes
quinta-feira, 23 de abril de 2009
Fortalecer o PT para mudar a UNE
sábado, 18 de abril de 2009
Para combater a crise econômica, Reforma Agrária JÁ!
A Reforma Agrária continua parada em todo o país. Exigimos o assentamento das 100 mil famílias acampadas e investimentos públicos nos assentamentos, como crédito para produção, habitação rural, educação e saúde. Temos famílias acampadas há mais de cinco anos, vivendo em situação bastante difícil à beira de estradas e em áreas ocupadas, que são vítimas da violência do latifúndio e do agronegócio. Relembramos nessa data o assassinato de 19 companheiros em Eldorado dos Carajás, pelas mãos da própria Polícia Militar. Esse fato, que demonstra a brutalidade com que o Estado trata com as reivindicações sociais, é mais um dos tantos de impunidade dos responsáveis. Depois de 13 anos, ninguém foi preso e o processo está parado no STJ.
Com as nossas ações, queremos denunciar a existência de latifúndios que não cumprem a sua função social, prevista Constituição Federal (artigo 184), que deveriam ser desapropriados para a Reforma Agrária. Os nossos assentados também passam por uma situação complicada, com a falta de investimentos públicos para crédito rural e infra-estrutura, como casa, saneamento básico, escola e hospital.
No contexto de crise econômica mundial, apontamos como saída para o campo a realização de uma Reforma Agrária ampla, massiva e popular. É a única forma de resolver o problema das milhares de famílias que não têm acesso às condições de produção, e daqueles que foram demitidos pelo agronegócio. Desde outubro, mais de 740 mil trabalhadores perderam seus empregos. O setor agropecuário foi responsável por responsável pelo fechamento de 145 mil vagas, 20% do total. Somado ao setor de alimentos e bebidas, que fazem parte do complexo do agronegócio, pode-se concluir que o setor foi o que mais demitiu na crise.
O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) concedeu em empréstimos, apenas no ano passado, mais de R$17,2 bilhões de reais para empresas do agronegócio. Menos de um ano depois, estas empresas já demitiram mais de 9.300 trabalhadores. O Banco do Brasil, em 2008, concedeu mais de R$ 10 bilhões para apenas 20 empresas do agronegócio, enquanto o Pronaf, voltado para 1,2 milhões de famílias de pequenos agricultores, recebeu apenas R$ 7, 2 bilhões para a safra 2008/2009.
A crise demonstra que estava certa a nossa avaliação de que o modelo imposto pelas empresas transnacionais, pelos bancos, pelo governo e pelo Estado para o campo brasileiro - chamado de agronegócio – não tem condições de melhorar a vida dos trabalhadores rurais e garantir a nossa soberania alimentar. O agronegócio não cria empregos e desemprega na crise. Paga baixos salários e desrespeita as leis trabalhistas, inclusive com a utilização de trabalho escravo. Não produz alimentos para o povo brasileiro e usa grandes extensões de terra para a monocultura para exportação, deteriorando o ambiente com o uso da monocultura, como de soja, eucalipto, cana-de-açúcar e pecuária intensiva, além do uso intensivo de agrotóxicos e de sementes transgênicas. Além disso, empresas estrangeiras passam a controlar o território brasileiro, por meio da associação com os latifúndios improdutivos, apropriando-se de terras que deveriam ser destinadas à Reforma Agrária.
Por outro lado, a FAO estima que pela primeira vez o número de subnutridos no mundo já atinge 1 bilhão de pessoas. Isso prova que, mais uma vez, quem mais sofre com os impactos da crise são os trabalhadores e trabalhadoras, que são os verdadeiros produtores de todas as riquezas geradas.
Os bancos brasileiros cobram as mais altas tarifas do mundo e seguem lucrando com a crise. Os grandes produtores do agronegócio também tentam empurrar para as costas dos trabalhadores os impactos da recessão econômica, e cobram do Estado medidas para atender seus interesses.
Avaliamos que a crise que se instalou em todo o sistema econômico é profunda, prolongada, e vai atingir todos os setores e países do mundo. Por isso seguiremos em luta, com outras forças da sociedade, para denunciar que a saída apontada pelos capitalistas não resolve os problemas do povo.
A Reforma Agrária é a política pública mais eficiente para gerar emprego e renda no campo. Garante a produção de alimentos e aquece a economia local. Ela deve estar inserida em um novo projeto de desenvolvimento para o Brasil, que coloque os interesses do povo brasileiro no centro da política.
sexta-feira, 10 de abril de 2009
O que é o Movimento Consulta Popular?
A intensa participação de diversos movimentos, instituições, pastorais e partidos na construção das marchas estaduais do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em 1997, constatou a capacidade de reorganização da esquerda em busca de uma maior unidade na luta. O processo de construção das marchas resultou na realização de uma primeira Conferência em Itaici, com objetivo de sistematizar as idéias e propostas surgidas durante as marchas no sentido de questionar o rumo de uma esquerda institucional e propor o resgate dos valores e práticas militantes rumo à revolução brasileira, bem como constituir as bases teóricas para um Projeto Popular para o Brasil.
Nos setores populares que não perderam o seu horizonte de esperança, em especial nos movimentos populares, iniciou-se um novo processo que permitiu que não fossem absorvidos pela lógica eleitoral que hegemonizou a esquerda. Segundo Marta Harnecker, desenvolveu-se na chamada esquerda social uma tendência para se separar dos atores políticos tradicionais ou renovados e para rejeitar o âmbito político como tal. Tais setores podem ter dois destinos: “esgotar-se numa introversão corporativa ou exprimir uma nova maneira de fazer política popular recompondo o tecido social a partir da base e articulando-se sob a forma horizontal e em profundidade”. Não é casual que a iniciativa da Conferência de Itaici, em 1997, onde surge a Consulta Popular, tenha sido da direção do MST. Sobrevivendo ideologicamente à grande crise do início dos anos 90, o MST se converte em principal referência da esquerda social. Uma referência de ousadia, radicalidade e valores. Ao se consolidar enquanto uma experiência que se fundamenta no trabalho de base, que desenvolve lutas de massa e forma novos quadros, o MST se transforma numa referência para os setores mais conscientes que não aceitavam a lógica pragmática dos limites institucionais, em especial entre a juventude. Na Consulta Popular se aglutinaram militantes de movimentos sociais que não aceitavam a lógica da política imposta pela esquerda eleitoral. A proposta organizativa do Movimento Consulta Popular nunca foi uma contraposição aos movimentos sociais existentes. Ao contrário, sempre se definiu como um instrumento de articulação dos lutadores e lutadoras do povo que propõe contribuir para mudar o padrão da luta de classes, incorporando no projeto político o ensinamento de Florestan Fernandes: “Frente à intolerância das classes dominantes contrapor a intransigência das classes oprimidas”.
Leia na íntegra o texto de Ricardo Gebrim, de novembro de 2005.
http://www.consultapopular.org.br/sobre/o-movimento-consulta-popular/
domingo, 5 de abril de 2009
Memória da ditadura
"Por isso, minha filha, esse seu jornal não pode chamar a ditadura de ditabranda, viu? Não pode, não. Você não sabe o que é a quantidade de secreção que sai de um ser humano quando ele apanha e é torturado. Porque essa quantidade de líquidos que nós temos, o sangue, a urina e as fezes aparecem na sua forma mais humana. Não dá para chamar isso de ditabranda, não. " Dilma Rousseff
Aos 19, 20 anos, achava que eu estava salvando o mundo
Dilma diz não ter a mesma cabeça da época em que era guerrilheira, mas se orgulha de não ter mudado de lado, e sim de métodos
MEMÓRIA DA DITADURA
Reprodução
Ficha de Dilma após ser presa com crimes atribuídos a ela, mas que ela não cometeu
FERNANDA ODILLA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
UMA DAS três sentenças de prisão de Dilma Rousseff, de 1971, a descreve como a inimiga que "jamais esmoreceu" desde que ingressou na luta armada contra o regime instalado pelo golpe de 31 de março de 1964 e dissolvido 21 anos depois. Leia a entrevista da ministra sobre a vida na clandestinidade durante a ditadura.
FOLHA - A sra. se lembra dos planos para sequestrar Delfim e montar fábrica de explosivos?
DILMA ROUSSEFF - Ah, pelo amor de Deus. Nenhuma das duas eu lembro. Nunca ninguém do Exército, da Marinha e da Aeronáutica me perguntou isso. Não sabia disso. Acho que não era o que a gente [queria], não era essa a posição da VAR.
FOLHA - A sra. logo percebeu que a clandestinidade seria o caminho natural?
DILMA - Percebi. Todo mundo achava que podia haver no Brasil algo muito terrível. O receio de que um dia eles amanheceriam e começariam a matar era muito forte. Sou bem velha, comecei em 1964. Com o passar do tempo, o Brasil foi se fechando, as coisas foram ficando cada vez mais qualificadas como subversivas. Era subversivo até uma música, uma peça de teatro, qualquer manifestação de rua. Discutir reforma universitária era subversivíssimo. Coisas absolutamente triviais hoje eram muito subversivas.
FOLHA - Foi escolha da sra. o trabalho no setor de mobilização urbana?
DILMA - Qual era a outra alternativa?
FOLHA - Havia a expropriação.
DILMA - Disso eu nunca quis ser. Nós não achávamos isso grande coisa. A partir de um determinado momento houve uma visão crítica disso, do que a gente chamava militarismo. É muito difícil falar isso porque as pessoas ficam achando que a gente está limpando a barra. Não me interessa ficar falando nisso, é da época e deu. Eu sei que havia uma tensão eterna. Nunca concordávamos uns com os outros porque pensávamos diferente. Bota todo mundo junto, você imagina. Não posso dizer o que aconteceu dentro da direção.
FOLHA - No Rio, a sra. acompanhou a fusão e acompanhou o racha [da VAR] em Teresópolis.
DILMA - Na minha cabeça, eu só lembro que a gente conversava e discutia muito, debatia. Tinha uma infraestrutura complexa porque a gente não saía de lá, não podia aparecer. Bom não era. Mas, naquela época, você achava que estava fazendo tudo pelo bem da humanidade. Nunca se esqueça que a gente achava que estava salvando o mundo de um jeito que só acha aos 19, 20 anos. Sem nenhum ceticismo, com uma grande generosidade. Tudo fica mais fácil. Tudo fica mais justificado, todas as dificuldades. Você não ter roupa não tem problema. Às vezes, andava com uma calça xadrez e uma blusa xadrez.
FOLHA - A sra. faz algum mea-culpa pela opção pela guerrilha?
DILMA - Não. Por quê? Isso não é ato de confissão, não é religioso. Eu mudei. Não tenho a mesma cabeça que tinha. Seria estranho que tivesse a mesma cabeça. Seria até caso patológico. As pessoas mudam na vida, todos nós. Não mudei de lado não, isso é um orgulho. Mudei de métodos, de visão. Inclusive, por causa daquilo, eu entendi muito mais coisas.
FOLHA - Como o quê?
DILMA - O valor da democracia, por exemplo. Por causa daquilo, eu entendi os processos absolutamente perversos. A tortura é um ato perverso. Tem um componente da tortura que é o que fizeram com aqueles meninos, os arrependidos, que iam para a televisão. Além da tortura, você tira a honra da pessoa. Acho que fizeram muito isso no Brasil. Por isso, minha filha, esse seu jornal não pode chamar a ditadura de ditabranda, viu? Não pode, não. Você não sabe o que é a quantidade de secreção que sai de um ser humano quando ele apanha e é torturado. Porque essa quantidade de líquidos que nós temos, o sangue, a urina e as fezes aparecem na sua forma mais humana. Não dá para chamar isso de ditabranda, não.
FOLHA - Quando a sra. foi presa, foram apreendidos documentos falsos, desenho da VAR e um bilhete de amor com as iniciais TG. Era do Cláudio Galeno Linhares?
DILMA - Não, era do Carlos Araújo. Era apelido dele. Se você quiser me mandar, eu agradeço. Onde que está isso, hein?
FOLHA - No inquérito arquivado no STM. O bilhete está assim: "Nêga querida, infelizmente não poderei estar aí [no Natal]. Verás na prática, prometo-te..." DILMA - Essa quantidade de te, você acha que é de mineiro, pô? Isso é de gaúcho. Tudo no te... Não falei do Carlos no depoimento. Eles acreditavam que era o Galeno. Carlos era da direção, eu não podia abrir a boca. Depois eles descobriram.
FOLHA - Como foi, durante os dias de Oban, para conseguir proteger a direção? Pelo que vi, alguns nomes não foi possível proteger como Maria Joana Telles, Ruaro, Vicente...
DILMA - Eles sabiam deles porque tinha caído outra pessoa que era da direção. Foi por isso que caí. Eu caí porque caiu outra pessoa.
FOLHA - Era com quem a sra. teria um encontro. O José Olavo?
DILMA - Essas coisas eu não quero falar, minha filha. Não quero dar responsabilidade para ninguém. Estou muito velha para fazer isso.
FOLHA - No depoimento da Justiça, a sra. cita os quatro como tendo caído em consequência direta de sua queda. A sra. dá os quatro nomes?
DILMA - É. Caíram, ponto.
FOLHA - Eu conversei com o hoje coronel, antigo capitão Maurício... DILMA - Ele existe ainda? Ele já não batia bem da bola. Ele continua sem bater?
FOLHA - Eu perguntei se ele votaria na sra. para presidente. Primeiro, disse não. Depois, pediu para retificar dizendo que "depende com quem vai concorrer".
DILMA - Minha querida, pelo amor de Deus. A vida é um pouquinho mais complicada que isso. Mas respeito o que ele falou.
FOLHA - Ele participava das sessões [de tortura]?
DILMA - Ele era da equipe de busca, nunca participou. Mérito dele. Pelo menos enquanto estive na Oban. Não posso dizer depois. Você tinha aquele negócio de dar ponto para parar de apanhar, e ele levava as pessoas. Ele fez a busca em toda a minha casa. Pegava minhas coisas e perguntava sobre elas.
FOLHA - No depoimento à Justiça, a sra. cita ele como responsável pelas sessões de torturas.
DILMA - Que ele torturava pessoalmente, nunca vi. A mim não foi. Que ele entrava na sala e via tortura, tenho certeza. Qualquer um entrava. Te torturavam com a porta aberta.
FOLHA - Li uma entrevista em que a sra. diz que fez treinamento no exterior, mas não consegui encontrar o período em que isso pode ter acontecido. Deu tempo de sair do Brasil para treinar?
DILMA - Acho engraçadíssimo porque quando me perguntaram isso, eu neguei que tivesse feito. É que nem aquela lista que sai aí dizendo que eu fiz dez assaltos armados. Nunca fiz uma ação armada. Se tivesse feito, eu estaria condenada por isso. É a mesma coisa essa história do treinamento. Nunca fiz nem treinamento no exterior nem ação armada. É só perguntar para as pessoas.
FOLHA - Incomoda a sra. atribuírem essas ações a seu nome?
DILMA - É chato. Não sou supermulher para dizer que não me incomoda. Agora não perco a cabeça por isso. Estão mentindo, têm segunda intenção.
FOLHA - Não teve treinamento no exterior, mas o básico todo mundo sabia como montar e desmontar uma arma. Era questão de segurança do dia a dia?
DILMA - Sempre fui muito dedicada, mas não achava isso grande coisa. Nunca fiquei avaliando se devia fazer isso ou aquilo. Não se colocava assim para nós. Falavam assim: "Vai ali e aprende a montar e desmontar a arma". Você ia e aprendia. "Vai ali e escreve um documento." Você também ia.
FOLHA - Como era o dia a dia da prisão? Algumas companheiras de cela dizem que a sra. dava aula de macroeconomia, mas não gostava muito dos trabalhos manuais de tricô e crochê...
DILMA - Aprendi bem. Sei fazer tricô e crochê. Você sabe que faço tapete? Mas não aprendi tapete lá, não. Fazia muito bem crochê. Podem falar que eu não fazia... (risos) No fim, gostava de fazer crochê. A gente lia muito, escutava muita música, conversava muito, jogava vôlei. [As aulas] estão fantasiando...
FOLHA - A sra. tinha consciência que continuava na mira da polícia mesmo depois da prisão?
DILMA - Tinha. Não podia fazer aniversário que ficavam pendurados nas árvores, olhando.
FOLHA - Quando tem o racha, quem assume a VAR?
DILMA - Não me lembro. Se o Espinosa tá dizendo que eu estava... Não sei se fui, se não fui [do comando]. É um período muito pequeno até a queda. Fui uma das primeiras a cair. Eu lembro que eu fui em outubro para São Paulo e nunca mais voltei [ao Rio]. Fiquei lá junto com todo mundo que dirigia a VAR na época. Só me lembro do José Olavo e de mais um. Tinha mais. Tinha quatro.
FOLHA - Muita gente dizia que a sra. era a responsável pelo dinheiro da organização. A sra. era o caixa de São Paulo, para manter militantes, aparelhos?
DILMA - Também não me lembro disso, não, que eu era do dinheiro. Se eu fosse do dinheiro, eles tinham me matado a pau. Tudo o que eles queriam era o dinheiro. Não lembro isso, não. Não me lembro de ter caído com um tostão. Se eu tivesse dinheiro, ia ser um festival.
FOLHA - O delegado ficou bem impressionado com a sra. depois do interrogatório. A ponto de defini-la como uma pessoa com dotação intelectual apreciável.
DILMA - Interessante... Da onde ele tirou isso, né? Nem me lembro dele. A gente não dava importância para o delegado do Dops, só para a Oban. Deve ter vindo da Oban. Tinha um juiz auditor louco (risos). Ele fez uma denúncia dizendo que eu era a Joana d'Arc do terror. Era ridículo. Ele era dado a essas...
FOLHA - É muito divertido o perfil que o delegado traça.
DILMA - Essa parte não era pública, essa parte do delegado. Você conseguiu um documento único. A Oban classificava a gente pelo nível de perigo. O major Linguinha [Waldir Coelho] só interrogava quem ele achava que era direção. Ele falava comigo sempre.
FOLHA - A sra. não pegou o delegado Sérgio Fleury no Dops?
DILMA - Quando entrei no Dops, o Fleury estava em viagem. Passei quase um mês na Oban e um mês no Dops. Eu custei a ir embora da Oban. Achava estranho eu não ir embora. Todo mundo ia, e eu ficava. Eu não lembro a data. Vai ficando muito obscuro, como foi e como é que não foi.
FOLHA - Vocês passavam por um treinamento intensivo para deletar as coisas. Tinha que esquecer para não contar?
DILMA - Uma parte você tentava esquecer. Sabe que teve uma época em que eu falei uma coisa que eu achava que era verdade e não era. Era mentira que eu tinha contado e aí depois eu descobri que era mentira. Você conta e se convence.
FOLHA - Informação obtida sob tortura é de responsabilidade de quem tortura e não de quem fala? Dá para culpar a pessoa que falou?
DILMA - Não dá mesmo. Até porque ali, naquela hora, tinha uma coisa muito engraçada que eu vi. Aconteceu com muita gente, não foi só comigo. É por isso que aquela pergunta é absurda, a do senador [Agripino Maia, do DEM]. A mentira é uma imensa vitória e a verdade é a derrota. Na chegada do presídio [Tiradentes], estava escrito "Feliz do povo que não tem heróis", que era uma frase do Brecht que tem um sentido amplo. Esse fato de não precisar de heróis mostra uma grande civilidade. É preciso que cada um tenha um pouco de heroísmo.
FOLHA - Quando a sra. chegou à Oban, houve muitos gritos?
DILMA - Teve. Fazia parte do script. É uma luta eterna entre a sua autodestruição e sua luta para ficar inteiro psicologicamente. A palavra correta é uma disputa moral no sentido amplo da palavra moral. É uma disputa entre éticas diferentes, entre princípios diferentes. Uma pessoa que se dispõe a fazer a outra ter dor tem um processo de difícil identificação. Fico imaginando o que foi Abu Ghraib, porque bota de um lado americanos e de outro lado um outro mundo. Você tem de ser desqualificado como ser humano para ser torturado, santa, senão você não é.
FOLHA - E a família da sra., como reagiu a isso tudo?
DILMA - Minha mãe foi absolutamente fantástica. Eles tinham horror de mãe.
FOLHA - Só para deixar claro, a sra. não se recorda desse plano para sequestrar o Delfim?
DILMA - Não. Acho que o Espinosa fantasiou essa. Sei lá o que ele fez, eu não me lembro disso. E acho que não compadece com a época, entendeu? Nós acabamos de rachar com um grupo, houve um racha contra a ação armada e vai sequestrar o Delfim? Tem dó de mim. Alguém da VAR que você entrevistou lembrava-se disso? Isso é por conta do Espinosa, santa. Ao meu conhecimento jamais chegou. Não me lembro disso, minha filha. E duvido que alguém lembre. Não acredito que tenha existido isso, dessa forma. Isso está no grande grupo de ações que me atribuem. Antes era o negócio do cofre do Adhemar, agora vem o Delfim. Ah, tem dó. Todos os dias arranjam uma ação para mim. Agora é o sequestro do Delfim? Ele vai morrer de rir.
FOLHA - De qualquer forma, obrigada por tocar nesse assunto delicado...
DILMA - Eu estou te fazendo uma negativa peremptória. Para mim, não disseram. Tá?
Vulcão entra em erupção e governo declara alerta no Chile
O vulcão Llaima, no Chile, entrou em erupção neste sábado e o governo decretou alerta vermelho em oito localidades próximas. O Llaima, considerado um dos vulcões mais ativos da América do Sul, fica a cerca de 700 km ao sul de Santiago.
As autoridades ordenaram o fechamento do Parque Nacional Conguillío, onde fica o Llaima, e retiraram as 14 pessoas que se encontravam nele, sendo cinco pedreiros, sete guardas e dois turistas, sendo um espanhol e outro chileno. Ao menos 70 pessoas devem ser retiradas das casas próximas, devido ao perigo da queda de cinza e a formação de novas inundações.
O vulcão, que há meio ano não apresentava nenhuma atividade, voltou a entrar em erupção na noite desta sexta-feira (3) e registra explosões constantes de material incandescente que se elevam até 600 metros sobre a cratera de 3.210 metros de altitude.
De acordo com o jornal "El Mercurio", três pessoas do centro de esqui das Araucarias também foram retiradas do local. O comitê regional de emergência, que se reuniu neste sábado em Temuco, decidiu também realizar um cadastro dos animais domésticos da região e analisar o tipo de cinza que o vulcão expulsa.
sábado, 4 de abril de 2009
Atenção! Confira aqui o processo para eleição de delegados para o 51º Congresso da UNE
Fique atento e acompanhe a divulgação das eleições nas universidades
Os processos para eleição de delegados para o 51º Congresso da UNE (CONUNE) já estão a todo o vapor. Nas universidades de todo o país, estudantes se mobilizam para apresentar suas chapas e dar início as campanhas.
O EstudanteNet será o canal de publicação de documentos sobre as eleições em todos os estados. As entidades credenciadas na 57ª edição do Coneg da UNE (Conselho Nacional de Entidades Gerais) devem preencher o formulário de credenciamento para o 51º CONUNE (baixe aqui) e enviá-lo para 51congresso.une@gmail.com.
Em breve, o hotsite do Congresso entrará no ar. Na página, os estudantes terão acesso a todo o processo que envolve a realização deste que é o principal fórum de deliberação do movimento estudantil.
Clique aqui e confira as eleições já convocadas.
Da Redação
RECONQUISTAR A UNE! Quem somos
Somos estudantes de Universidades públicas e privadas, engajados em transformar esse meio que, no momento, passamos a maior parte do nosso tempo. Através da ação direta no Movimento Estudantil, contribuímos para acumular na transformação do nosso mundo.
Participamos de Centros e Diretórios Acadêmicos, DCE´s, UEE’s, UNE ou de Executiva de cursos. Todos os momentos, lá estamos, lutando por uma educação pública para todos/as, pelos nossos direitos, por uma outra universidade, mais democrática, popular, mais do povo e menos dos poderosos.
Para nós a Universidade deve ser profundamente democrática permitindo aos estudantes e a comunidade definirem o seu futuro. Precisa ser necessariamente pública para que possa servir aos interesses de todos/as e não apenas do grande poder econômico.
Além disso, acreditamos ser necessário que a Universidade atenda as demandas da grande maioria da população, além de ser uma peça estratégica que deve estar em consonância com um projeto mais justo para o Brasil.
Lutamos pela universalização do acesso ao ensino superior público e gratuito porque acreditamos ser um direito inalienável de qualquer pessoa o acesso ao conhecimento acumulado pela humanidade ao longo de sua história.
Lutamos na Universidade privada por mais regulamentação, pois enquanto não conquistamos a educação pública para todos/as, estamos lá avançando nas conquistas, ponto a pondo, pela garantia de melhor qualidade de ensino contra os abusos dos grandes tubarões do ensino. Lutamos nisso também porque sabemos que enquanto não reduzirmos o poder da educação privada nesse país, será difícil conquistarmos a implementação de políticas universalizantes na educação.
Fizemos muita mobilização contra o projeto neoliberal implementado por Collor e FHC. Muitas greves, trancamentos de rodovias, ocupações de reitorias. Tudo contra a idéia de repassar a responsabilidade do acesso à educação para cada um e cada uma, contra a redução de verbas para a educação pública, contra o sucateamento das Universidades e a abertura indiscriminada de universidades pagas, pela assistência estudantil nas universidades, etc…
Mobilizamos as Universidades pela eleição de Lula em 2002. Acertamos, pois começamos a ajudar a trilhar um caminho para mudar esse país. Jamais tivemos a ilusão que tudo seria mil maravilhas e por isso mesmo, nos mantemos na trincheira das lutas para garantirmos presentes as nossas bandeiras. Acertamos novamente, pois cabe a nós mostrarmos o caminho para esse governo, disputá-lo dia-a-dia.
Lutamos contra muitas medidas que não representavam aquilo que sempre defendemos. O governo Lula conciliou muitas vezes com a hegemonia neoliberal construída por FHC, mas seguimos confiantes que a posição mais acertada era não arredar o pé da luta para tencionar esse governo a aprofundar as mudanças e abandonar a pauta conservadora e privatista! Era continuar defendendo o que sempre defendemos diferente daqueles que não entendem a diferença de um governo Lula a um governo da direita conservadora desse nosso país.
Mobilizamos novamente em 2006 onde essa diferença ficou nítida! Fomos protagonistas da polarização programática nas ruas a favor de um país com mais distribuição de renda e educação pública!
Agora, nosso grande desafio é radicalizar nas mobilizações para que o segundo governo Lula democratize as universidades, amplie radicalmente o acesso ao ensino público e resolva o problema do financiamento da educação superior. Poderia começar trocando o presidente do Banco Central e acabando com as desvinculações de orçamento da educação (DRU) para pagar a dívida!
Somos estudantes que se referenciam no PT, na esquerda do PT e na sua tendência interna, Articulação de Esquerda. Acreditamos ser possível construir um outro mundo. Um mundo onde a máquina de moer gente já não exista. Um mundo socialista!
Lutamos por um Movimento Estudantil diferente. Para nós só ampliaremos as lutas no ME se ele for radicalmente democrático, autônomo, combativo e de lutas.
Defendemos uma profunda democratização da UNE para que ela assuma o seu papel histórico de tornar o Movimento Estudantil num forte movimento de massas capaz de transformar a Universidade e o nosso país.
Nesse novo momento que estamos vivendo em nosso país, o Movimento Estudantil e a UNE têm o dever de assumir papel protagonista, pois é preciso aprofundar as mudanças no Brasil.
Cabe à UNE entender esse papel histórico. Mas para isso, será necessário fazer com que a UNE tenha uma relação real com os estudantes brasileiros, com as demais organizações estudantis. Só conseguiremos isso se democratizarmos essa entidade, se fizermos com que ela tenha uma postura autônoma e protagonista frente o governo e que possa retomar a organização de amplos setores dos estudantes brasileiros.
Por isso, gostaríamos de apresentar uma alternativa de direção para a UNE: a “Reconquistar a UNE”!
Pois, acreditamos ser possível mudar o ME, a UNE e o Brasil. Acreditamos ser necessário no centro da própria engrenagem, inventar a contra-mola que resiste e reconquistar a UNE para as lutas e para os estudantes!